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Pedir a receita é o melhor dos elogios a quem comanda a cozinha. Leia meu artigo publicado na revista Veja.
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Maria Callas era conhecida por abordar chefs nos melhores restaurantes ao redor do mundo, onde ela se apresentava em suntuosas casas de ópera encantando o público com árias inesquecíveis.
A soprano, cuja estreia profissional completa oito décadas neste ano, anotava tudo na hora em discretas folhinhas de papel, enquanto desfrutava a companhia de empresários e artistas com quem dividia a mesa.
Mais tarde, entregava o material a ajudantes, que se encarregavam de registrar as aventuras gastronômicas da cantora, como experimentar um risoto de trufas, quando a estação era adequada.
Chefs, aliás, não eram suas únicas fontes.
Com frequência, ela consultava donas de casa, recortava receitas de revistas e, com sua primeira sogra, chegou a aprender a preparar alguns pratos típicos de Verona, na Itália.
O hobby era levado a sério.
Callas adorava comprar utensílios por onde passasse.
Se o palco não fosse sua primeira vocação, ela certamente teria feito carreira de sucesso na cozinha.
Cozinhar é se dedicar ao outro.
Callas às vezes mal provava o que fazia, sempre cuidando da silhueta, depois que, já famosa, conseguiu perder, em um ano, cerca de 40 dos mais de 100 quilos que chegou a pesar.
Mas o prazer de cozinhar era o mesmo, e a curiosidade, inesgotável.
Ela sabia que, para um chef, um pedido para revelar uma receita soa como o mais genuíno dos elogios.
Os melhores deles, aqueles que não temem a concorrência, em geral têm prazer em compartilhar suas descobertas.
Eu também sempre cultivei o hábito de garimpar receitas mundo afora.
Nos restaurantes, não me acanho de perguntar ao chef como se prepara o prato que despertou minha atenção.
Quando gosto do que comi, quero saber tudo.
Quais são os ingredientes?
Como é o preparo?
As medidas, a técnica, os truques, os fornecedores, os segredos dos cozinheiros — nada escapa à minha curiosidade.
A conversa vai tão longe que alguns deles se tornaram meus amigos.
Quando não tenho liberdade para interrogar o chef, não hesito em lançar mão de subterfúgios para saber mais sobre a delícia que acabei de saborear.
Em alguns lugares fora do Brasil, onde a preocupação com a saúde do cliente é maior, cheguei a dizer que tinha alergia a determinados alimentos — só para saber se eles integravam a receita.
A mentirinha inofensiva já rendeu resultados surpreendentes.
Considero que um dos meus maiores feitos nessas pesquisas de campo, por assim dizer, foi ter obtido a receita de uma pizza de atum num restaurante de Nova York chamado Bond St — a eye tuna tart.
A massa é uma espécie de bolachinha ultrafina e leve.
Na cobertura, delicadas fatias de carpaccio de atum.
Escondida entre uma camada e outra, há uma mistura à base de maionese, molho ponzu cítrico, shoyu, wassabi, gengibre, minifolhas de rúcula e flores comestíveis.
Pense em algo delicioso — e essa pizza vai superar sua mais alta expectativa.
Decidi que não retornaria ao Brasil sem a receita na bagagem.
Voltei três, quatro vezes ao restaurante, para decifrar a iguaria.
Quando descobria um ingrediente dizia que tinha alergia a algum outro — até conseguir a lista completa.
Da próxima vez que você apreciar um prato, cumprimente o chef pedindo a receita.
Publicado originalmente na revista Veja.
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